domingo, 27 de março de 2011

Pagando o sapo.

Arlete era doméstica.

Mulata batalhadora, honesta e ingênua.

Servia a uma família e Arthurzinho, o caçula de 03 anos, era louco por ela, a ponto de ficar notadamente triste nos sábados, domingos e dias que a dublê de babá e cozinheira faltava.

O angu ilhado em um prato de feijão era a maneira peculiar que Arlete alimentava seu pequeno fã.

Numa determinada manhã, chegou meio atrasada para preparar sua iguaria. Atrasada e assustada.

Sra. Maria, a patroa, indagou: “Arlete, isso são horas??”

Arlete correu para o banheiro e se pôs a chorar.

A chefa teve dó e foi atrás, disse: “Arlete, não fique assim... não estou brigando, só quero saber se tudo está bem...”

“Não, não está!”, respondeu abrasivamente a mucama. “E eu não sou ‘Arlete’, sou ‘Marise’!”

O bafafazinho chamou atenção do pequeno Arthur, que veio até à porta da cozinha para ver o que acontecia.

Ainda meio abalada, Arle.. digo, Marise saiu do banheiro e explicou: “Sabe oque que é, D. Maria? É que eu soube que uma vizinha, num sei por causa de que, pôs meu nome velho na boca de um sapo...”.

D. Maria disse: “Arlete, deixa de bobagens, menina... essas coisas não existem... anda, vamos começar os trabalhos do dia logo, Arthurzinho jajá vai querer comida...”.

“Não!”, disse a servidora.

“Quero ser chamada de Marise agora!”

O dia de trabalho foi passando, e tantos outros.

Em longos três anos que Arlete serviu àquela família, foi chamada de Marise pelos habitantes da casa umas 5 vezes, todas por D. Maria, e três só no primeiro dia.

Arthur só a chamava de Lelete.

O tempo passou, Arlete não sofreu nenhum mal que pudesse ser fruto de macumba, muito pelo contrário, hoje é uma pequena, mas bem sucedida, comerciante de seu bairro.

Enfim, todos seguiram suas vidas Maria, Arthur, o chefe da família, os irmãos e todo mundo.

Ah! Menos o sapo, foi difícil explicar à Dona Rã quem era Arlete e porque carregava aquele nome dentro de sua boca. Morreu a cascudadas, coitado.


MÚSICA A CALHAR:

Escreveu o seu nome no papel/ Botou na boca de um sapo/ Cruzou e cozeu boca de bicho/ E soltou ele no mato/ Quando ele morrer de fome/ Sumcê vai para buraco.” (“Eu ta vendo no fundo do copo” – Noriel Vilela).

segunda-feira, 21 de março de 2011

A condenação: estigma.

Passei um longo tempo sem postar aqui, volto a tratar de tema que muito me aflige.

Com se sabe, há um suspeito folclore de que pessoas nascidas no Reinado de Cachoeiro de Itapemirim seriam bairristas.

Ora, não é só porque o seu filho mais bobinho perdeu a perna e virou Rei, ou o fato de o Rio que atravessa seus vales, formando corredeira e cachoeiras, ao desaguar numa baixada de relativo tamanho, forma o Oceano Atlântico, que saímos aos quatro ventos cantando essa marra.

Não, definitivamente não é por isso.

Rubens Bragas, Luz Del Fuegos, Carlos Imperiais, Sérgio Sampaios, Sérgio Bermudeses e Bujicas à parte, o maior fator de nosso amor à nossa terra é um singelo: a nossa região foi a primeira a ser habitada pelo homem pré-cabraliano.

Ééééé... segura essa malandro!!

Vá ao Museu Nacional no Rio de Janeiro, procure por uma ponta de flecha que lá está. Ela remonta há dez mil anos atrás, os primórdios da ocupação hominídea no Brasil.

Isso quer dizer que o primeiro lugar no Brasil apto a ter o desenvolvimento humano foi a nossa região, fato que encaro com naturalidade.

De lá, os cachoeirenses saíram para dominar todo o Brasil, como de costume.

O artefato teria sido encontrado em Cachoeiro, na região de Vargem Alta há muitos anos atrás.

Opa!!

"Como assim? Foi encontrado na sede do Reino ou em sues arredores de climatização temperada? Vargem Alta é outro lugar, pô!" Aposto que foi assim que o leitor amigo refletiu...

Esse fato é importante para um outro assunto que gosto de tratar e popularizar: a vida do advogado.

Calma e vamos lá, já explico.

Sempre que me identifico como causídico, o interlocutor manda aquela: “Ahhh! Você é advogado? É que eu tenho um primo que está preso...” ou “É que eu fui demitido, quero saber o que eu tenho direito...”

E por aí vai...

Gente, uma coisa deve ficar clara, advogados têm especialidades. Muito embora muita coisa possa ser resolvida por princípios gerais de Direito, uma opinião sincera e segura deve ser colhida após certo estudo.

Desconfie de quem se arvora a conhecer todas as especialidades, esses se enrolam, sem dúvida. Essa “modalidade”de advocacia é rara, própria de decanos. Talvez seja por essa e por outras que o advogado seja um profissional tão estigmatizado.

Pois bem, agora fazendo a clássica mescla dos assuntos (comum aos posts deste acanhado e ingênuo blog) até aqui tratados.

Afinal, a Ponta de Flecha é cachoeirense ou de Vargem Alta (nem sei o gentílico do simpático lugarejo)?

Sem dúvida que o Direito resolve e, para não cansar ainda mais vocês, serei direto como uma flecha! (¬¬)

Bem, um princípio geral de direito: tempus regit actum, confere?

Logo, se a Ponta de Flecha foi achada antes de 1988, na região de Vargem Alta, assim, antes de sua emancipação Política, para todos os efeitos, foi achada em Cachoeiro, pois até então, lá era Distrito desse.

Uma questão de Direito Intertemporal.

Como o direito é lindo! Resolve a porra toda!

E melhor, nos legitima, ainda mais, a professar o amor à sagrada terra caliente do Cachoeiro (só não moro lá...).






MÚSCICA A CALHAR:

“Put your house out up for sale? Did you get a good lawyer?” (Valerie – The Zutons, versão original da canção, pela banda que é oriunda do equivalente a Cachoeiro na Bretanha, Liverpool).

PS.: Um "em tempo" necessário e que me faz lançar mão da liberdade poética, para o texto. Eis o email que recebi ontem, pouco depois da postagem, do Arqueólogo Sr. Prof. Celso Perota:

"Prezado Vitor,

Realmente existe no acervo do Museu Nacional, um artefato que é uma ponta de projétil de grupos de caçadores que habitaram a região de Vargen Grande de Soturno e na Serra da Gironda.

É uma ponta feita em quartzo, com técnicas avançadas de lascamento e provavelmente foi utilizada na caçada da megafauna que habitou a região cerca de 7.500 anos atrás.

Além dos artefatos arqueológicos existem na coleção uma outro acervo paleontológico, representado por ossos de grande animais como a preguiça gigante, tatu canastra e, provavelmente o tigre de dente de sabre.

Um abraço

Perota"

Ou seja, que Vargem Alta que nada...